O autor finlandês Reijo
Knuutinen inicia seu artigo expondo, já no resumo, o conceito de
Responsabilidade Social Corporativa – CSR, segundo o qual a sociedade espera
que as empresas levem em conta os efeitos
econômicos, ambientais e sociais de suas operações e atividades.
Seu objetivo no trabalho
é realizar a revisão deste conceito, sob o aspecto da tributação, analisando o
que seria considerado planejamento tributário agressivo neste complexo sistema,
que não necessariamente encontra origem e conceitos na legislação.
Planejamento
tributário agressivo não é um conceito legal, portanto, não há uma definição
legal para isso. Em vez disso, a questão é mais ou menos sobre onde traçar a
linha de aceitabilidade moral, que é executada dentro da área de planejamento tributário.
Do ponto de vista da CSR, o planejamento tributário agressivo pode ser definido
como ações tomadas pelos contribuintes
que estão na linha de exigências da legislação tributária, mas que não atendem
às expectativas e exigências razoáveis e justificadas das partes interessadas
(acionistas, devedores, contratantes, arrecadadores de tributos, etc).
A responsabilidade
das empresas em pagar tributos foi inserida pelo autor no aspecto econômico da
CSR, não sendo necessário estabelecer uma nova dimensão para as
responsabilidades sociais dos negócios.
Ele parte então de
alguns questionamentos, elencados a seguir.
A Responsabilidade
Social Corporativa tem algum significado e importância no contexto da
legislação tributária e, especialmente, da tributação sobre a renda? Se a
resposta for 'sim', quais são as implicações, por exemplo, para o planejamento
tributário e as outras atividades relacionadas a impostos das empresas? A RSER
estabelece limites no planejamento tributário das empresas, ou existe uma obrigação de pagar mais
impostos do que o que deve ser pago de acordo com a lei e os tratados
tributários? (não sei se entendi
bem essa parte. Como assim pagar mais que o devido? Isso seria uma consequência
da responsabilidade social? Ela é tão importante que pode ser necessário ir além
das obrigações legais para que a empresa seja considerada socialmente
responsável em todas as dimensões e por todos os interessados. É isso?)
O autor também faz uma ressalva: o conceito de
RSE não é legal, então a sua abordagem também não é apenas legal, vai além e
considera também aspectos de gestão e ética empresarial.
Ele aborda ainda
certa contradição existente na obrigação de pagar tributos, na medida em que se
trata de um custo como qualquer outro, mas também a forma que a empresa possui
de contribuir economicamente para a sociedade em que está inserida. Ou seja, é
preciso equilibrar a necessidade de reduzir os custos ao máximo (pagar menos
tributos) com a importância de contribuir para o Estado na realização e
garantia dos direitos por ele assegurados à população.
Não adianta apenas
ser responsável social e ambientalmente, sem recolher tributos de maneira a
contribuir para a sociedade. Nesse contexto, por outro lado, não é possível
encontrar todas as diretrizes na legislação, já que elas têm abrangência apenas
local. É necessário analisar a questão considerando também diretrizes
internacionais não compulsórias e princípios não legais, especialmente em
relação às empresas multinacionais.
A análise feita é
muito interessante, na medida em que, a todo o tempo, o autor explicita que se
trata que questões que vão além da mera obrigação legal, e estão no campo da
moralidade e da ética. Não basta cumprir a lei.
A questão é: uma
corporação tem algum tipo de responsabilidade social, além de suas obrigações
legais?
Ao desenvolver a ideia
de que a questão vai além da legalidade, o autor traz ideias do direito natural
e do direito positivo, para concluir que a RSE tem mais afinidades com o
direito natural, por ser algo quase que intuitivo.
Ele explica que, no
sistema positivista, para uma norma ser válida, não necessariamente estará
alinhada à moral e à justiça. Um exemplo disso é a ideia de equidade vertical. (Eqüidade Vertical é a idéia de que os
contribuintes com maior capacidade para pagar deveriam pagar maiores montantes
de impostos – progressividade). Não há resposta científica para a questão,
por exemplo, se a tributação deve ser progressiva ou não. As leis tributárias
são frequentemente compromissos de diferentes visões e opiniões, que refletem o espectro de valores e
considerações morais.
Após a entrada em
vigor de um estatuto tributário, é apenas o próprio estatuto que tem relevância
na aplicação da lei. Consequentemente, a questão é: as questões morais têm alguma relevância dentro da tributação?
- Importância da representatividade
na elaboração de leis. O cenário do ordenamento tributário vai refletir os
valores morais de quem elabora a legislação.
Para construir o
raciocínio proposto, o autor estabelece a diferença entre moralidade das
aspirações e moralidade do dever, sendo aquela calcada em características e
ações que estão acima do mínimo desejado/permitido, enquanto esta calca-se
neste mínimo, nas regras básicas sem as quais uma sociedade não se estabelece.
A moralidade do dever possui uma natureza negativa, está relacionada ao que não
se deve fazer.
Malum
in se e malum prohibitum: cooperar x cumprir.
Os contribuintes
muitas vezes justificam e defendem suas ações referindo-se ao fato de que
agiram de acordo com a lei e os regulamentos, o que significa em primeiro lugar
referir-se à letra da lei. No entanto, para a sociedade isso nem sempre é bom o
suficiente; é esperado e exigido que o espírito da lei seja seguido,
referindo-se ao objetivo e propósito da lei tributária.
A moralidade da
tributação é essencialmente vinculada à lei, mas isso não significa que seja
apenas a letra da lei que importa. Em vez disso, o espírito ou propósito da lei
deve ser levado em consideração.
O que é o Companies Act?
Após passar pela
perspectiva histórica da RSE, em que é exposta a diferença da ideia corporativa
do início do século 19 (paternalismo do dono) e atual (propriedade diferente de
gestão, estado responsável pelo bem estar social), o autor expõe a questão
sobre o que, de fato, é uma empresa.
Citando Avi-Yonah, o
finlandês expõe três tipos diferentes de abordagens para compreender a
corporação:
Historicamente, três
visões da corporação surgiram e giraram de maneira cíclica. A primeira é a
visão de que a corporação é primariamente uma criatura do estado (a visão de
“entidade artificial”). A segunda é que a corporação é uma entidade separada do
Estado e de seus acionistas (a visão da “entidade real”). A terceira é que a
corporação é apenas um agregado de seus membros individuais ou acionistas (a
visão “agregado” ou “nexo de contratos”) .
Fato é que,
independentemente da visão que se tenha sobre o conceito, a natureza e os
objetivos de uma empresa, o dever de pagar tributos ressai inafastável sob
qualquer ponto que se olhe. “Assim, parece que qualquer que seja a visão que a
gerência faça de sua relação com os acionistas, com a sociedade e com o Estado,
nunca se justifica perseguir estratégias tributárias que tenham como único
objetivo minimizar os pagamentos de impostos da corporação ao governo.” Daí a
justificativa de se adotar a RSE em qualquer situação.
Na sequencia, o autor
analisa uma certa ambivalência da natureza dos tributos para uma empresa,
esclarecendo que são custos de transação e, como tal, devem ser reduzidos ao
máximo, mas também são uma espécie de distribuição
dos lucros, na medida em que eles representam a contribuição da empresa
para usufruir da estrutura e segurança fornecida pelo estado para que ela tenha
retorno, lucros.
“Ter que pagar impostos altos é o resultado de
um negócio bem sucedido.”
Conceito de RSE pela Comissão Europeia de 2011: “um conceito pelo qual
as empresas integram preocupações sociais e ambientais em suas operações comerciais
e em sua interação com seus stakeholders de forma voluntária”. Não inclui a
dimensão dos tributos.
Novo conceito: “a
responsabilidade das empresas pelos seus impactos na sociedade”
Apesar de a Comissão
Europeia não incluir a face fiscal nas dimensões da RSE, ela incentiva os
Estados a terem práticas da boa governança fiscal: transparência, o intercâmbio
de informações e a concorrência fiscal justa.
Estou achando a visão
do autor um pouco utópica, ao tratar dos tributos com uma forma de as empresas contribuírem
com a estrutura e o ambiente de segurança fornecido pelo Estado para que ela
possa existir. Talvez na Europa isso faça mais sentido, mas em países em
desenvolvimento, como o Brasil, tal aspecto é questionável.
Por outro lado, bem
ou mal, a estrutura de sociedade organizada minimamente garantida pelo o Estado
é o que permite tanto empresas, quanto cidadãos, existirem com dignidade, o que
justifica a importância de pagar tributos e não fazer uso de planejamento
tributário agressivo.
Me parece também um
pouco ingênua a visão de que as empresas devem evitar planejamento tributário agressivo
mesmo no contexto de “concorrência fiscal.” Isso se dá em um ambiente de
concorrência fiscal justa, o que também não se verifica no âmbito interno
brasileiro, conforme se vê nos casos de ICMS e IPVA, verdadeiros exemplos de
guerra fiscal. De todo modo, também é necessário ponderar a importância de a
empresa recolher seus tributos de maneira justa e colaborativa, o que torna
complexa, portanto, a compreensão do que configuraria planejamento tributário
agressivo.
Num dado momento, o
autor pontua que as empresas não são obrigadas a recolher tributos para além
das previsões legais, mas que deveria expor seus princípios de planejamento e
gestão tributária nos relatórios de RSE. Isso começa a esclarecer a questão
posta acima, sobre se existiria a obrigação de pagar mais impostos que os
devidos.
“Quando uma empresa
desenvolve atividades de planejamento tributário e de gestão tributária normais
e apropriadas, os fluxos de caixa após os impostos (CF₁, CF₂ ...) aumentam devido à
economia de impostos. Portanto, o valor do acionista aumenta. Não há nada de errado ou inapropriado com
isso.”
No tópico 4.1, em que
o autor diferencia sonegação fiscal de evasão fiscal legal (planejamento tributário
agressivo) a planejamento tributário adequado (para além das meras obrigações legais),
ele afirma que “Para as autoridades fiscais, apenas a distinção entre
planejamento tributário e elisão fiscal (tax avoidance) - ou seja, a distinção
legal de acordo com a legislação tributária - é relevante.” De acordo com o que
temos estudado, não parece ser bem assim, já que os propósitos negociais têm
sido cada vez mais verificados pelas autoridades para observar a existência de
planejamento tributário agressivo.